Segundo advogada, além da busca por justiça, medida pretende evitar que casos semelhantes aconteçam
Após conclusão do inquérito sobre o caso da morte da menina de 2 anos em Campo Grande, o pai da criança e seu companheiro decidiram processar as autoridades envolvidas por omissão. De acordo com a advogada do pai, Janice Andrade, a decisão foi tomada, apesar de não trazer de volta a vida da criança, buscando justiça por ela, e por outras crianças.
“Entraremos com processo contra os órgãos cabíveis, inclusive contra a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde), a qual entendemos que era de responsabilidade dos profissionais que ali atuam, e tiveram contato com a Sophia, de não se calarem com tal conduta”, iniciou Janice.
Apresentando datas, a advogada alegou que a menina foi agredida pelo padrasto no dia 16 de novembro de 2022, com um corte na cabeça e a boca sangrando. No mesmo dia, ela teria dado entrada na unidade de saúde, de acordo com oprontuário dela. “Isso não foi relatado na época, passada para a frente essa informação que era de suma importância. Ela estava com dor abdominal, o que segundo os especialistas, é um pedido de socorro quando a criança começa a apresentar sinais como este. Ninguém fez nada nessa situação, assim como nas demais, posteriormente”, afirmou ao O Estado.
No dia 18 do mesmo mês, a menina foi até a unidade de saúde com a perna quebrada. “Na oitiva assistida do filho mais velho do padrasto, de apenas 6 anos, ele relatou que quem havia quebrado a perna da Sophia tinha sido o pai dele, com chutes. Isso está no inquérito que foi apurado. Com base em todas essas informações, a prefeitura terá de responder por isso, porque omissão é crime, segundo a Lei Henry Morel que já estava em vigor”, pontuou a advogada.
A prefeitura será processada, pelas omissões por parte do Conselho Tutelar e da Sesau, o Estado por omissões e da prevaricação da Polícia Civil no caso da Depca (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente), informou Janice à reportagem.
“Vai ser processado todo mundo que não contribuiu para salvar a vida da menina de alguma forma, os entes estatais que são o Município e o Estado. Também estamos com um instituto de enfrentamento de violência familiar, por onde estamos estudando as possibilidades de efetuar uma denúncia internacional, para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos”, reforçou ela.
Antes de perder a vida, a menina foi levada pelo pai até a delegacia da Depca para prestar depoimento especial. Conforme informou a delegada titular da casa, Anne Karine Sanche, durante o depoimento a criança disse apenas seu nome e idade, sem apresentar comportamentos anormais.
De acordo com a psicóloga Steffani Rodrigues, o processo de terapia está alicerçado em um pilar, que talvez tenha sido desconsiderado naquele momento: o vínculo.
“O vínculo entre paciente e psicólogo é o primeiro ponto a ser trabalhado para que haja condições dessas aberturas, como no caso. Uma criança de 2 anos, por mais que estivesse em um local tranquilo, ‘preparado para lhe trazer segurança’ na teoria, pode não se sentir confortável em verbalizar ou indicar situações de sofrimento psicológico ou físico. Talvez, o melhor dos cenários teria sido recomendar um acompanhamento dessa criança. E isso, judicialmente, pode ser requisitado pelo Ministério Público.
Inclusive, em clínicas com gratuidade como os atendimentos nas universidades”, disparou.
Para a presidente da Comissão de Defesa de Direitos da Criança e do Adolescente da OAB/MS, Maria Isabela Saldanha, além do mau atendimento e das possíveis omissões que vêm sendo averiguadas, existe um familismo em toda rede de proteção. “Esse familismo tende a proteger o núcleo familiar restrito à ideia de pai, mãe, filhos. Desconsiderando outros modelos de família e ignorando que os casos de violência contra crianças, na grande maioria, são intrafamiliar. Por isso, muitas vezes, pais, avós, tias e outros parentes encontram uma barreira imensa para proteger suas crianças.”
Em Mato Grosso do Sul, foram registradas cinco mortes de crianças vítimas de homicídio doloso em 2022. Em 2023, até o momento, já foram duas crianças no Estado. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) considera criança a pessoa até 12 anos de idade incompletos.
Repercussão nacional
Mesmo após dez dias da morte da menina de 2 anos, a ficha parece não ter caído para muitas pessoas. A violência que causou a morte da pequena extrapolou as divisas de Mato Grosso do Sul e causou comoção no país. Artistas e celebridades no Brasil criaram a campanha nacional #JustiçaPorSophia, que ganhou apoio na rede social Instagram.
Na internet, diversos perfis de pessoas desconhecidas, mas também de muitos artistas, estão publicando uma série de reclamações e críticas envolvendo o caso da menina que foi vítima de espancamento e estupro causados pela própria mãe, 24 anos, e pelo padrasto, 25 anos. Atores e digital influencers fizeram um vídeo onde o intuito é pedir justiça pela menina e criticar a atuação do Judiciário no crime, que teria rejeitado as solicitações do pai em pedir a guarda da filha, por ser homossexual e morar com outro homem.
“Quantas perdas a gente precisa ter para ver que dois pais formam uma família?”, perguntou o youtuber e digital influencer Christian Figueiredo em seu perfil. “Com apenas 2 anos ela foi morta e estuprada. Um verdadeiro absurdo”, disse a atriz global Rosane Gofman. “Onde está escrito que duas mães não podem fazer uma criança feliz?”, questionou a atriz e ex-modelo Gianne Albertoni, completando o raciocínio sobre a homossexualidade na criação das crianças. No vídeo participam outras figuras conhecidas pelo público, como o influencer Hugo Bonemer, o empresário e influencer Mauro Sousa e a ativista Mari Bridi.
Por Brenda Leitte – Jornal O Estado do MS.
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