Discussão pretende restringir horários de provas, garantindo igualdade de condições entre candidatos
Após o falecimento precoce do goiano Arthur Matheus Martins Rosa, durante a realização do TAF (teste de aptidão física) em Campo Grande, uma série de discussões jurídicas e políticas estão sendo debatidas. Dentre elas, o projeto de lei 228/2023 do deputado estadual Pedro Kemp, que pretende regulamentar a realização do teste em concurso público, no âmbito estadual.
“Saiu de Góiás um candidato para realizar um sonho, chegou para fazer a prova às 6h, pois foi informado que era por ordem de chegada, e fez a prova só às 13h, no horário mais quente do dia. Passou mal com o calor extremo, demorou a ser atendido, foi encaminhando para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), foi internado no hospital do pênfigo, intubado, e veio a óbito. Arthur veio atrás de um sonho e a família veio buscar seu corpo”, lamentou o deputado.
Diante disso, Kemp defende que os testes de aptidão sejam regulamentados por lei e em discussão com os profissionais da saúde e de esporte. “Proponho regulamentar os testes, para que sejam feitos de forma mais adequada. Entre as exigências para se submeter ao Teste de Aptidão Física (TAF) é a apresentação de um atestado médico que comprove as condições físicas do candidato. O TAF não pode se tonar um teste de sobrevivência. Recebi muitas mensagens de policiais militares que pedem a regulamentação destes testes que chegam a ser cruéis, há opressão em cima dos candidatos e que sejam disciplinados para que não aconteça uma tragédia dessa”, justificou Kemp.
Ao jornal O Estado, o profissional de educação física, Márcio Alexandre Alencar, explicou que, dependendo das condições ambientais, o candidato precisa se adequar, não é como uma atleta que é preparado para sofrer todo o tipo de mudança. Além disso, o TAF exige uma preparação mínima de 12 semanas antecedentes à prova, com auxílio de profissional habilitado.
“É preciso ter uma adequação e recuperação. Condições de hidratação e descanso. Evitar também horário de pico de calor. Como é uma prova física, o candidato deve estar capacitado fisicamente, mas uma coisa é correr num tempo pré-determinado em uma temperatura de 25ºC e outra é ter que correr numa temperatura de 40ºC. É preciso considerar o desgaste e minimizar as perdas com uma recuperação e hidratação adequadas”, explicou o profissional físico.
Cabe destacar que Arthur era agente penitenciário e “concurseiro”, ou seja, já havia realizado outros testes de aptidão física. Além disso, ele estava apto, conforme os exames médicos realizados anteriormente à prova atestaram. “O jovem faleceu e houve continuidade dos testes nas mesmas condições do dia anterior. Ao todo, 20 candidatos foram socorridos por terem passado mal nos dias em que os testes aconteceram” apontou o deputado, com indignação.
O jovem foi velado no último sábado (5), no Cemitério Memorial Parque, em Goiânia. A irmã de Arthur, Luciana Martins, que também é médica, lamentou o ocorrido e destacou que a banca organizadora deveria ter levado os fatores climáticos em conta, antes de aplicar os testes físicos.
“Nada vai trazer o meu irmão de volta e isso é muito doloroso, mas precisamos ir atrás de Justiça, para que isso não aconteça com outras pessoas, porque a prova continuou acontecendo e teve gente passando pelas mesmas condições. E por que essa prova não foi feita em outro mês? Logo no mês de agosto! A gente está no Cerrado, parece que o povo não sabe que aqui vira praticamente um deserto. O processo de quem foi aprovado já estava há um tempão, por que não realizaram numa época de chuva? Então, tem várias outras coisas que eles poderiam ter pensado para fazer isso de uma forma mais humana”, apontou a irmã da vítima.
Em 2023, quatro pessoas já perderam a vida em TAFs
Em janeiro deste ano, dois candidatos perderam a vida durante a etapa de teste físico do concurso da Polícia Penal de Minas Gerais, realizado em Lagoa Santa, região metropolitana de Belo Horizonte. As vítimas foram Samuel Douglas Pereira de Carvalho, de Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, e Paulo Roberto Freitas, de Belo Horizonte. Samuel era instrutor de autoescola e tinha 25 anos. Ele morreu no dia 12, já Paulo Roberto tinha 30 anos e morreu na terça-feira (10 de janeiro), quando realizava a mesma prova. Os dois passaram mal durante o TAF (teste de aptidão física). Os casos foram registrados após a corrida de resistência dentro do CIAAR (Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica). Ambos chegaram a ser socorridos e levados até a Unidade de Pronto Atendimento, mas não resistiram.
Em fevereiro deste ano, outro candidato perdeu a vida após passar mal em teste físico do concurso da PM do Amapá. Na ocasião, Alone Petrus Leite, 30, que lutava por uma vaga de soldado no concurso da Polícia Militar do Amapá, morreu no dia 9, após passar mal durante um teste de aptidão física realizado na quarta-feira (8). Alone Petrus era advogado, inscrito na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Seccional do Amapá. Ele não sabia, mas tinha citoacidose diabética, o que levou à falência dos rins após o teste físico. Segundo a família, Alone sonhava em compor o quadro da Polícia Militar do Amapá, em homenagem à memória de seu falecido pai, Pedro Leão de Souza, policial civil do ex-território do Amapá. Ele chegou a ser socorrido em um hospital de Macapá, mas não resistiu.
Cenário de mortes também foi registrado no ano passado. Em novembro, Efraim Menezes Marinho Lima, 27, candidato à vaga de soldado no concurso do CBMAM (Corpo de Bombeiros do Militar do Amazonas), morreu após passar mal durante um teste de aptidão física, realizado no dia 3 daquele mês. Ele estava internado no Hospital Delphina Aziz, em Manaus. Segundo a família da vítima, ele era natural de Santarém, no Pará, e foi pra Manaus só para fazer o teste de aptidão física, do concurso.
Meses antes, em 24 de junho, outro candidato morreu, ao participar de um teste físico para inspetor da Polícia Civil do Rio de Janeiro. Uma pessoa que filmava o teste registrou o momento em que Fábio Henrique Silva, 41, aparentou estar desorientado e chega a cair na pista de corrida. As pessoas que assistiam até incentivam Fábio a levantar e terminar a prova. Ele ainda tentou continuar, mas não conseguiu e caiu mais uma vez. Após o fim do teste, o homem foi socorrido e levado a um hospital, mas não resistiu.
Em 10 de março, o soldado Pedro Henrique Pereira dos Santos, 18, formado na Polícia do Exército, morreu após ter passado mal depois de uma bateria de exercícios. Em nota divulgada na época, o Exército afirmou que o rapaz foi “prontamente atendido pelo médico do quartel” e “em seguida, ele foi levado para o Hospital Central do Exército e, devido a complicações, veio a óbito”. Segundo a família, ele tinha desidratação grave.
No dia 14 do mesmo mês, um cadete do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, Gabriel Lourenço da Silva, 24, passou mal durante uma caminhada no Parque Estadual da Pedra Branca, na Zona Oeste do Rio. Ele chegou a ser intubado, mas não resistiu.

Foto: “Uma coisa é correr com 25ºC e outra com temperatura de até 40ºC”, diz Márcio Alexandre, preparador físico / Arquivo pessoal
Por –Suelen Morales e Michelly Perez.
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